quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Gostava de ir a Mogadouro, pelo caminho velho


Que gostava de ir a Mogadouro, pelo caminho velho! A pé. Era o dos Olmos debaixo da parreira do Barranco para alguns residentes. Que lhe bastava um para companhia. Que por ser sábado de festa não havia nada que fazer! Porque torna, porque volva, que era coisa de uma hora e não custava nada!
Que a tarde até estava fresca...
Ao narrador que, a despeito de ser gordo e estar cansado, gosta destas coisas, foi fácil convencer. E surpreendentemente até os residentes aderiram à empresa. E lá foram, o Artur, o Ilídio, o alcaide, para oficializar a coisa, e o doutor dos Olmos. Entusiasmado com a proposta que não com a forma de a concretizar, foi-se com eles também o escrevente. (A pé? A estas horas!? Com este calor!)
Sem cajado, nem calagouça abalaram em direcção à sede da comarca, com disposição de peregrinos e passada e andamento das praças recrutas.
Por desinteressante e demais conhecido, nada se dirá da parte do caminho até à Cruz. Há-de mais tarde falar-se da Urreta, mas tão só pela frescura da água, que não por especial merecimento do lugar.
E eis-nos então a descer para Valdremum.
Mas não, vamos antes por Cinzas. Já quase sem carvalhos. E um lameiro que já não serve. Pois se ninguém lhe segou o feno! se não lhe pastaram a erva, para que serve o lameiro?!
Logo estamos no Rouxinho. Lá está a casa do tio Meão. Ou o que antes foi.
Nem pássaros nem ninhos. Nem tão pouco lagartos no caminho. A hora, não sendo já de sesta, é ainda das cigarras.
De resto as terras são as mesmas de dantes. De restolho mas sem rilheiro. De adil quase todas. E de saudade. Tomamos agora para os lados da Azênia mas logo arrepiamos caminho. À corte do Barroso descemos para Milhares. Foi terra de lameiros, e freixos e viço. E de passagem obrigatória para pagar a finta e para a feira dos Gorazes. De feirantes e romeiros.
Encostados aos lameiros da Azênia, subimos para o Butaque.
A partir daqui haveríamos de ver, por vinhas, hortas e quintais, gente da vila. Qual quê!? Nem vivalma. Nem burros nem atafais. Nem rolas nem melros. Um gaio mudou de freixo. E foi o muito.
Enfim, caminho abandonado o da vila. Já não é andado nem por aprendiz nem por mestres dos ofícios. Não encontrámos nenhum daqueles rapazes despachados que aprendiam as artes de alfaiate, sapateiro, de ferreiro ou até de mecânico. Não se viu qualquer cachopa que fizesse o caminho a industriar-se na ciência dos lavores e da costura. Daqui até os peliqueiros enjeitaram.
Já na fonte da Santa Margarida, refresca-se a secura e as ideias. E já vemos o soto do Heitor. E em frente devia estar o Porfírio das retretes.
Olha aqui era o consultório do Dr. Cordeiro. E ali era a Farmácia. E ainda é. E a livraria do Adroaldo. Lugar de culto. Enorme no pedestal, imenso no engenho, o nosso Trindade Coelho. Em frente eram os Casimiros. E lá está ainda o Tribunal.
Naquele passeio, devia estar o Octávio com a sua caixa a engraxar sapatos. Já nem o Rato por aqui se enxerga.
Mas pronto é a vila, e o caminho foi andado.
Ficaram satisfeitos os andantes.

Este texto, não sendo pura ficção, que a tanto não está habilitado o narrador, é quase ficção, já que em razão do que se trata, é compulsivo mentiroso. Mesmo longe estou presente! Basta ouvir dizer e também lá estive!
Mas não. Não fiz a viagem. Esperei por eles na vila. À sombra de dois copos de cerveja e à espera das contas dos caminheiros. Que onde há caminheiros há contas!
Faz de conta que fui.
Ah, o dos Olmos tinha uma cana, e na vila não sabia que lhe fazer!?

Um abraço
f.ribeiro

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

FEIRA DO AZINHOSO, VI Mostra de Exemplares da Raça Asinina de Miranda


A Feira Anual do Azinhoso foi revitalizada em 2004 pela AEPGA e a AIVECA - Associação para a Investigação e Valorização Etnográfica e Cultural de Azinhoso em conjunto com o município de Mogadouro e a Junta de Freguesia de Azinhoso. O empenho da população local, juntamente, com o apoio prestado pela organização do evento levou a que se recuperasse antigas tradições como a gincana de burros, que sempre desafiaram os mais arrojados e foliões do Azinhoso e aldeias adjacentes. A Feira do Azinhoso pretende, desta forma, reavivar antigas tradições bem como promover e sensibilizar interessados e criadores para a preservação da Raça Asinina de Miranda considerada, actualmente, pelo Ministério da Agricultura como uma raça ainda ameaçada.

ENTRADA LIVRE!

Sábado, dia 5 de Setembro
Aldeia do Azinhoso


17h00: Merenda Regional com os criadores de burros e gaiteiros da região (recepção dos visitantes)
19h00: Arruada (animação de rua)
20h00: Jantar- Convivio
21h30: Concerto de música tradicional

Domingo, dia 6 de Setembro
Aldeia do Azinhoso

7h30: Chegada dos criadores e seus burros
8h30: Missa em honra da Nª. Sª da Natividade
10h30: Gincana de Burros
12h30: Almoço - Convívio
14h30: Mostra e desfile de Burros da Raça Asinina de Miranda
15h30: Entrega de troféus e prémios de participação
16h00: Festa Popular

Nota: O programa poderá ainda ser alterado.

Para mais informações: http://www.aepga.pt/portal/PT/111/EID/85/DETID/1/default.aspx ou contactar 96 6151131/96 0050722 ou pelo e-mail burranco@gmail.com




quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Perdi-me no adro da igreja

Em meados da década de cinquenta do século passado havia uma fonte chã de água ao cimo do adro da igreja a que chamávamos Funtoz. Esta designação era dada às poças de água de nascente limitadas por pedras de xisto colocadas ao cutelo que sustinham a água. Tanto quanto me lembro esta fonte tinha água durante todo o ano e era utilizada para lavar a roupa e para as galinhas, perus e parrecos beberem.
Esse dia em particular estava a lavar nessa fonte a Tia e por ali serpenteávamos , em brincadeiras da nossa idade, eu com quatro anos e o meu irmão José com dois anos. Deviam ser estas as nossas idades pois o Zé já andava e eu como que tomava conta dele desde que não saíssemos muito da beira da Tia.
Esta situação, lembro-me passou-se quando morávamos na rua do Fundão, ou seja em 1957 ou depois, porque a nossa casa foi construída em 1957, conforme data que tem no frontispício. Durante a sua construção tínhamos vivido na casa do meu avô Francisco, ali à Rua dos Paus, onde mais tarde o meu primo Tomás fez a sua casa.
Contam que era muito atinadinho e sossegado e que na casa do meu avô a minha mãe me deixava na varanda com um naco de mão centeio e um penico e vestido com um bibe. O meu irmão João, mais velho três anos, esse é que não parava, estava sempre na jolda pelo povo fora.
A Tia era a nossa madrinha, irmã da minha mãe e madrinha de quase todos os meus irmãos. Ainda hoje e já velhinha é a Tia! Mesmo o seu filho lhe chamava tia. Como para quase sempre na vida há uma explicação, também aqui há uma razão para lhe chamarmos tia, apesar de termos mais tias. Para as outras tias usávamos a palavra tia seguida do seu nome. Mas para a tia Carmelinda era a Tia. Já ao meu tio António, marido da Tia, sempre chamámos padrinho.
E a razão de ser a Tia é que os meus pais tiveram muitos filhos e quase invariavelmente era padrinhos de baptismo o meu tio António, irmão do meu pai, e a minha tia Carmelinda, irmã da minha mãe. Foram dois irmãos que casaram com duas irmãs.
Como os meus pais eram mais velhos, casaram antes e tiveram também filhos antes dos meus padrinhos. Por conseguinte quando nasceu a Elisa, minha irmã mais velha, os meus padrinhos ainda não eram casados. Quando foi baptizada foram padrinhos da Elisa o tio António e a tia Marquinhas, os dois irmãos mais novos do meu pai. Quando a minha irmã começou a falar chamava naturalmente Padrinho ao seu padrinho, Madrinha à sua madrinha e Tia à sua tia Carmelinda!
E depois da Elisa nasceram a Helena, a Carminda, o Francisco, o João, o António que sou eu, o José, o Martinho e o Armando. Houve ainda outros filhos que não vingaram, tendo morrido pequeninos.
Como a Elisa chamava Tia à tia, todos os outros lhe seguiram o exemplo, apesar de ser ela a madrinha de todos os restantes. Como as casas do meu pai e do meu padrinho eram uma em frente da outra, o filho da Tia aprendeu também a chamar tia à sua própria mãe.

Estava então a tia a lavar na funtoz e na sua roda o Zé e eu na brincadeira, talvez com um pedaço de cortiça a fazer de carro de bois bem carregado de feno.
Quando dei por ela o Zé, com dois anos, já não estava à minha beira e não sabia para onde tinha ido. Estando tão perto do adro da igreja resolvi ir a dar a volta ao adro a ver se o via por “estar à minha guarda”. Convém referir que o adro da igreja fazia um U em sua volta, rodeando-a havendo duas entradas uma de cada lado da igreja. Havia ainda outra entrada que dava para o fundo do povo. A Funtoz era do outro lado da rua e pertinho de uma das entradas de cima, no caso perto da perna direita do U.
Entrei então no adro e dei a volta ao adro. Entretanto a Tia deixou de ver os seus dois sobrinhos e foi a casa, a cerca de cem metros. Como o Zé tinha ido para casa, rapidamente o encontraram, mas de mim é que ninguém sabia.
Dado como perdido, foram então outra vez à funtoz, agora já vinha a minha tia uma das minhas irmãs, penso que a Elisa, com o pequeno Zé ao colo. Entretanto vinha eu a subir o adro quando os vi a todos. Como tinha perdido o Zé eu estava a chorar e foi a chorar que me viram quando me encontraram! E o que ficou para a história foi que o António, o Toninho ou o Tóino, se perdeu no adro da igreja e que foi o Zé, com dois anos que foi a saber dele e que o encontrou.

Quando era novito ainda tentei repor a verdade, mas nunca consegui! Quando comecei a ter juízo das coisas achei que a versão da verdade dos outros era bem mais interessante do que a minha e desisti da minha versão.
Porém como a verdade é só uma, aqui fica a verdade verdadeira de eu me ter perdido no adro da igreja. Será que estarei, em termos psíquicos, a caminhar para a meninice?

António Magalhães
Enviado por email